Era uma manhã ensolarada de quarta-feira, ele havia cabulado os dois primeiros dias de aula na escola nova. Havia visto alguns rapazes que não gostou e preferia pedir transferência. Foi essa a desculpa dada a sua mãe. Por isso, ao chegar na porta da sala naquela segunda-feira ele retornou e tomou o ônibus de volta para sua casa.
Terceiro dia de aula. Foi obrigado pela mãe a entrar naquela sala de estranhos, com pessoas estranhas, bem longe do antigo colégio, dos antigos amigos que estudaram com ele desde o jardim de infância. Agora teria que superar os medos, fazer novos amigos e ainda tirar boas notas. Já possuía um estágio como professor de informática, informação que preferia guardar para si, pois todos o chamariam de nerd e o excluiriam do grupo de amigos.
Entrou, e no primeiro assento da terceira fileira de carteiras reconheceu um rosto. Uma amiga da antiga turma, que por ventura, caíra na atual escola. Não eram mais tão próximos, desde o ginásio. Conversavam muito na sexta série quando ela ainda não frequentava bares ou gostava de bandas excêntricas, se afastando assim, e só retomando a amizade no ano anterior. Ele a conhecia desde o primário. Completariam doze anos de amizade naquele verão. Sentou-se atrás dela e um sorriso se fez em seu rosto, logo ela virou-se para conversar. Estava se sentindo sozinha e deslocada, sentia que não pertencia ao lugar. Da mesma forma que ele.
Papearam durante aquela tarde e ficaram isolados do resto da classe. Ficou óbvio que seriam os amigos nerds da sala, que não possuiriam qualquer vínculo com outros alunos, isolando-se em seu mundo utópico.
No dia seguinte estavam ansiosos por fazer novos amigos, sentaram-se um pouco mais ao fundo para não serem tachados de nerds e torceram para que alguém os notasse. No fim do segundo tempo uma menina espalhafatosa se aproximou, olhou para a folha de fichário do garoto e berrou em alto e bom som, forçando a atenção de toda a classe para os três.
- Nossa, Paulo! Que letra linda!
A menina puxou a cadeira que estava atrás dele e pediu a folha da aula emprestada. Ela colocou a folha ao lado de uma sua e começou a escrever qualquer coisa. Ele, curioso, se aproximou e observou o que ela estava fazendo. Concluiu que estava copiando a sua letra.
- É assim que eu devo fazer?
Ele virou o rosto para sua amiga da frente, fez-se dois segundos de silêncio e os dois começaram a rir em uníssono, uma característica que ainda não tinha se perdido. A menina que escrevera sem dar muita importância voltou a tagarelar.
- É sério, mano! Como tu faz essas letras? O seu “A” eu já peguei o jeito, ele tem a perninha assim, levantada. Vou ficar treinando.
O garoto sorriu e perguntou o nome da garota.
- Meu nome é Maria Paula.
- Eu sou Paulo Henrique e essa é minha amiga Bia.
Dali pra frente os três se aproximaram, cada dia mais, mesmo cada um tendo uma característica isolada. Ele parou de julgar as pessoas pela aparência e pelos gostos. Estavam ali, reunidos três vértices de um triângulo. Um nerd, que mais tarde aprendeu a gostar de roque. Uma roqueira, que mais tarde aprendeu a gostar mais de moda. Uma patricinha, que mais tarde parou de chamar a atenção e aprendeu a dar valor aos verdadeiros amigos.